quarta-feira, 9 de junho de 2010

O que o desastre da BP pode nos ensinar o sobre a tomada de decisão das pessoas nas organizações?

Por Fabiano Rangel
Blog: Sustentabilidade em Movimento
Data 09/06/2010

O desastre socioambiental ocorrido (abril/2101) no Golfo do México, em que teve como protagonista a corporação britânica Britsh Petroleum ou Beyond Petroleum (BP), mais uma vez coloca em cheque a forma como grandes organizações têm dialogado com as demandas da sociedade e o quanto estão ou não investindo realmente em modelos de negócios mais responsável, justo e sustentável.

Este foi um desastre de proporções catastróficas e ao que tudo indica deixará o episódio de 1989 com o Exxol Valdez (derramou mais de 40 milhões de litros óleo na costa do Alasca) para trás de longe. Sendo que ainda hoje a fauna marinha da região do Alasca sofre com o acidente ocorrido há mais de 21 anos.

Muito provavelmente o recente acidente com a plataforma Deepwater Horizon não será diferente. Após um incêndio que durou cerca de dois dias a plataforma explodiu, vitimando 11 funcionários e despejando sobre o mar milhões de litros de óleos (os dados oficiais estimam cerca de 5.000 barris diários). Ainda é cedo para precisar quão comprometida será a fauna marinha da região, mas com certeza não será em proporções irrelevantes e junto com esse comprometimento, muitas pessoas que vivem da pesca e de outros recursos e serviços ofertados pela vida marinha também serão seriamente prejudicadas. Atualmente pescadores da região deixaram seu principal ofício para trabalhar nas embarcações de contenção do óleo, expondo suas vidas e saúde a riscos desconhecidos.

A costa da Lousiana, provavelmente será a mais afetada. Inicialmente se estima um prejuízo nessa região de U$2,5 bilhões só com a indústria da pesca, além do impacto no turismo. No litoral da Flórida já se estima um prejuízo na cifra de U$3 bilhões.

O chefe de operações da BP, Doug Suttles, já declarou que a empresa tem gastado certa de U$6 milhões por dia para tentar limpar a mancha de petróleo que se arrasta pelo Golfo do México além de tentar conter o vazamento. No mercado de capitais as ações da BP já apresentaram quedas de mais 7% desde o vazamento.

Algumas declarações dos executivos da BP, de ex-executivos e de fontes da mídia alternativa trazem a tona que o risco de um acidente dessa natureza era alto e de conhecimento de muitos dos engenheiros e executivos responsáveis pela operação. A falta de manutenção e uso de material não apropriado para o tipo de operação foram apontados nos últimos relatórios anuais, mas pelo que tudo indicam foram ignorados por alguns tomadores de decisão e pelo visto, também por investidores (considerando a posição favorável que a BP tinha no mercado de capitais antes do acidente). Então, por que mesmo sabendo dos riscos a operação teve continuidade? Por que não se paralisou a operação até que os riscos fossem novamente gerenciados a quase zero?

Se medidas dessa natureza tivessem sido tomadas, poderíamos estar diante de um case de sucesso e não de um acidente. Estaríamos então diante um evidente caso de negligência empresarial? Diria que sim, mas não apenas, afinal organizações e empresas não são uma entidade etérea, sem cheiro, cor, carne, corpo e face onde podemos colocar toda a responsabilidade, até porque seria cômodo colocar a responsabilidade nesse ente etéreo. Como responsabilizar uma empresa neste caso? Só financeiramente? Isso seria uma medida suficiente? Uma organização só tem vida e existência porque tem pessoas fazendo a sua gestão e tomando decisões. Porque tem gente usufruíndo dos bens e serviços que a organização produtos e porque tem gente investindo na sua atividade.


É evidente que existiu uma negligência da BP, e ela está no fato de suas políticas e processos não terem sido suficientes para detectar as falhas existentes, como, por exemplo, o fato dos responsáveis ignorarem os relatórios operacionais que apontavam riscos eminentes, mas acima disso, temos a negligências das pessoas que tomaram suas decisões com base em valores frágeis no que diz respeito aos valores universais direitos humanos e da responsabilidade com a vida, isso sem contar a própria sustentabilidade financeira da organização, tendo visto o alto volume de recursos que foram e serão alocados para contornar o problema. Imagina todo esse recurso sendo empregado no desenvolvimento de novas tecnologias energéticas com capacidade de promover uma economia de baixo carbono? Ou mesmo na melhoria da operação da BP para torná-la mais eficiente e segura?

Existem muitas perguntas e muitas respostas podem soar simples. Até poderíam existir respostas simples, mas deixamos a coisa um pouco mais complexa, pois existem muitos elementos culturais e políticos que deixam qualquer resposta para questões dessa natureza complexa e de difícil resolução. Principalmente quando se observa toda a dinâmica econômica e social que há por traz da indústria do petróleo e mais, quando nos colocamos diante do problema e percebemos nossa forte dependência do insumo e seus derivados. Na mesma linha de raciocínio também não é simples de se explicar a nossa dificuldade em ter mais investimento em tecnologias para melhorar a eficiência energética das nossas máquinas e veículos em pleno século XXI. Como isso pode ser tão difícil se há muito tempo já conseguimos colocar o homem na lua? Com certeza não é por falta de inteligência e tecnologia.


Vivemos em uma sociedade com muitos paradoxos mal resolvidos.

Tão complexa é essa resposta que mesmo no auge do furacão, quando a BP ainda está tentando responder como irá minimizar os danos causados pelo acidente, seu executivo chefe também está realizando inúmeros malabarismos para assegurar duas respostas ao mercado: primeiro, assegurar a imagem de uma empresa solida capaz de suportar toda a pressão financeira; segundo de que tentará encontrar meios de remunerar seus acionistas e investidores a contento, mesmo com tantas outras prioridades. Sei que parece estranho, mas neste momento me pergunto se essa não deveria ser uma preocupação colocada em segundo o terceiro plano.

O bom senso me ajudaria a responder que sim, contudo, se o bom senso fosse observado, provavelmente a operação teria sido paralisada muito antes do acidente e não seria necessário fazer essa pergunta. A necessidade de justificar os dividendos segue a mesma lógica que boa parte das respostas que encontraremos para não paralisar a operação.

Contudo, nossas empresas e executivos estão cada vez mais responsáveis, a BP por exemplo, exemplo, que em um ato de extrema fraternidade e compromisso social por meio de seu CEO, Tony Hayward, anunciou que assumirá integralmente todos os danos decorrentes do acidente que forem comprovados e mais, segundo a matéria da UOL Notícias que acompanha esse comentário, a BP irá criar uma nova empresa só para administrar os danos decorrentes do vazamento. Será mesmo que estamos cada vez mais responsáveis? E nossas organizações? Nosso mercado de capitais? Por que todo esse cuidado não foi tomado antes? Não havia recursos para isso?

O mais irônico é que esse acidente aconteceu justamente com a BP, uma das pioneiras no segmento de Óleo e Gás a se rever e se posicionar diante da sociedade como uma empresa de energia e não apenas de extração e refino de petróleo e gás (não sei se alguém já viu alguma história parecida em algum outro lugar).

Não faz muito tempo que a BP assumiu publicamente a alto nível de contribuição do seu principal produto para o atual cenário de aquecimento global que vivenciamos. Assim, desde o início da década de 90, tem empreendido alguns esforços para se reposicionar como uma empresa de energia, buscando investir mais em fontes energéticas de menor impacto socioambiental, tendo seu relatório de sustentabilidade de 2006 reconhecido pelo GRI como um exemplo a ser seguido pelo setor. Neste relatório a BP ousou e abriu pontos sensíveis como demissões, desmatamento, emissões de CO2, explosão de uma refinaria e tudo isso com apresentação de detalhes e estatísticas.

Notem que no relatório de sustentabilidade de 2006 a BP já havia relatado um acidente grave em uma refinaria no Texas ocorrido em 2005. Estamos falando de cinco anos do último acidente grave ao de agora com a plataforma Deepwater Horizon e isso em meio a um grande esforço para tornar a BP reconhecida como uma empresa de energia mais responsável e sustentável em âmbito global. Então o que aconteceu?

Seria muita pretensão da minha parte querer responder prontamente a essa pergunta. Contudo, uma coisa eu posso inferir, nossas organizações empresariais sofrem de uma arrogância contraproducente e isso acaba somatizando sobre as pessoas que as representam, empresas e pessoas diante da necessidade de se mostrarem sólidas, auto-suficientes e agora sustentáveis, não trabalham bem os valores pessoais e organizacionais que poderiam fazer a diferença, não fazem um uso estratégico e adequado de ferramentas disponíveis como, por exemplo, o GRI (só para pountuar considerando que essa é uma ferramenta usada por eles) e não incorporam essas premissas na hora de decidir quais riscos podem e devem ser assumidos, quais processos precisam ser melhorados e o mais difícil, decidir quando é hora de rever alguns passos e re-orientar trajetórias, principalmente quando isso pode implicar em uma possível revisão na projeção de crescimento da empresa.

Como a sustentabilidade desejada é esse processo em movimento, portanto não temos todas as respostas e como ainda há tempo (pouco) de aprender com nossos erros, vou torcer e continuar trabalhando para que nossas organizações e nós enquanto profissionais que as representam, tenhamos a humildade de aprender com essa triste catástrofe e fazer diferente e melhor em novas oportunidades.



BP deve criar empresa para cuidar dos efeitos do vazamento no Golfo do México

Fonte: UOL Notícias
04/06/2010 - 14h12 / Atualizada 04/06/2010 - 14h29

Londres, 4 jun (EFE).- A companhia petrolífera britânica British Petroleum (BP) anunciou hoje que pretende criar uma empresa encarregada especificamente de cuidar das tarefas de reparação e fazer frente aos efeitos do vazamento de petróleo ocorrido em uma de suas plataformas no Golfo do México.

O executivo-chefe da empresa, Tony Hayward, precisou em uma teleconferência com investidores que a nova entidade será dirigida pelo responsável na América pela BP, Bob Dudley, que velará pelo cumprimento de "todas as obrigações" da companhia.

Hayward assegurou que a nova empresa não irá fazer "uma reorganização de ativos", só de pessoas, de modo que o trabalho de resposta à catástrofe no Golfo do México possa ser separado da atividade normal da companhia petrolífera.

O diretor reiterou o "compromisso total" da BP para resolver a situação criada pelo acidente do dia 20 de abril na plataforma Deepwater Horizon, em que 11 pessoas morreram e que deu lugar a um vazamento de petróleo de consequências extremamente graves para o meio ambiente.

Hayward assegurou que neste momento é impossível prever o custo total para sanar o desastre, que, além da reparação da plataforma, incluirá a limpeza do entorno e as correspondentes indenizações e multas, mas adiantou que será "pesado".

No entanto, especificou que a empresa, que calcula perder bilhões de dólares em petróleo devido ao derrame, se encontra em uma posição financeira "sólida", tanto em liquidez como em ativos, para fazer frente às reivindicações.

O Governo americano disse ontem à noite que vai enviar a BP uma primeira fatura de US$ 69 milhões pelas tarefas de limpeza na área do Golfo, que a companhia deve pagar antes do próximo dia 1 de julho.

Quanto ao pagamento trimestral de dividendos, um assunto que preocupa muito os acionistas e, em consequência, as bolsas de valores, assinalou que a empresa tentará encontrar "um equilíbrio" entre suas obrigações com os investidores e sua necessidade de destinar dinheiro para resolver o vazamento e investir no futuro da companhia.

"Faremos o possível para proteger o valor da empresa na qual vocês investem", disse Hayward aos acionistas, mas não pode precisar se será cobrado um dividendo no prazo previsto de 22 de julho.

O presidente da BP, Carl-Henric Svanger, presente na teleconferência, indicou por sua vez que até essa data a empresa irá decidir qual é a melhor maneira de distribuir os recursos, levando em conta a inquietação manifestada pelos investidores.

O executivo-chefe reconheceu que o acidente aconteceu porque uma série de "processos, sistemas e equipamentos" que deveriam ter prevenido o desastre não funcionaram.

Nesse sentido, disse que o acidente é um sinal de alerta para toda a indústria e lembrou que a BP investirá US$ 500 milhões em pesquisa para melhorar a segurança.

É importante "recuperar a confiança" dos empregados (80 mil no total, 30% dos quais está nos EUA), dos investidores (com 40% nesse país), da
comunidade na zona do Golfo e em geral do mundo, já que disso depende o futuro da companhia, advertiu.

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